O silêncio do seu corpo em pé, erguido no ar dos dias, desamparado como uma janela que em tarde qualquer não estará aberta, nem fechada, em parte alguma do mundo (...).
Vê-la é dizer-me : sol colhido, resumo de horas atravessadas de aviões e batidas de mar, fechado abismo: oh vertiginoso acúmulo de nadas! (...)
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O seu rosto (será esplendente? duma dura luz?) não se ergue jamais; no extremo desconhecimento se esfacelará, dobrado contra o seu ventre de terra. O que somos, o ser, que não somos, não ri, não se move, o dorso velhíssimo coberto de poeira; secas, as suas inúmeras asas, que não são para voar, mas para não voar. O que somos não nos ama: quer apenas morrer ferozmente. (...)
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A lama, a sua cintilação. Os capins explodidos. O fedor da inconsistência. As árvores, os troncos, a casca. A solidão, a solidão da vida! (...)
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As pedras do chão e as que se levantaram em vôo. Em verdade, tudo cai. Os rios nunca passam. O lodo, a mesmice das águas. O nada. Giram giram. O homem de pé. O homem sentado. O homem de costas. Bicho sem apoio! (...)
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O homem caminha. É um rio andando. É uma árvore, andando. A lama, andando; o sol, andando. O homem é um peixe de cabelos e morte clara. Os pés no chão. O rosto no ar do mundo, no vácuo conciso, sem tempo, porque onde nada sucede para além do engano.
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Velha, a solidão da palavra, a solidão do objeto; e o chão - o chão onde os pés caminham.Donde o pássaro voa para a árvore.
*** Poeta Ferreira Gullar.
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