"A arte de vencer se aprende nas derrotas" (Simon Bolívar)
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Não tenho o costume de acreditar em mandingas, pissica.Contudo, nos últimos tempos, a vida anda me pregando peças.
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A começar pelo glorioso Botafogo - nada nada e morre na beira.
Os leitores haverão de dizer: o cronista faz proselitismo, chora de barriga cheia.Pode ser. Mas eu pergunto: quem gosta, quem sabe perder ?
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Desde que me entendo por gente, me acostumei a perder.Torço pelos mais fracos. Sejam elas pessoas, times, cavalos azarões. Se por um lado quase sempre entro pelo cano, por outro, quando a sorte me bafeja -curto de montão!
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Faço um breve interregno para recordar minha primeira e significativa derrota.Andava pelos meus dez anos e morava no Rio.Treinava exaustivamente para o campeonato estadual de judô. Tudo ia às mil maravilhas.Ganhei por ipon ( a pontuação máxima) todas as etapas.Pela primeira e derradeira vez, era o franco favorito.Na finalíssima iria enfrentar um garoto que eu estava cansado de bater.Confiante só esperava a hora do término da peleja para abocanhar o troféu, para correr pro abraço.
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Mal sabia eu que meu opositor estava preparado e já conhecia meu golpe predileto.Quando tentei, ele me aplicou um poderoso contragolpe.Se fosse uma luta de boxe, seria nocauteado. Só me lembro de ter alçado vôo
e do baque surdo do meu corpo se estatelando no tatame.Venci seis batalhas e perdi a derradeira, a mais importante delas.
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Cabisbaixo, subi ao pódio para receber minha medalha de prata.No caminho, fui abordado pelo meu mestre e mentor, o sábio Tanaka Sam.
Jamais esquecerei suas proféticas palavras: levante a cabeça, engole o choro, enxugue as lágrimas. E, por favor, nunca mais substime ninguém!
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Depois desse episódio, perdi a conta das vezes que perdi.Porém, jamais entreguei os pontos, me dei por vencido.No frigir dos ovos - durante minha lassa vida,perdi a maioria das vezes.A penúltima se deu domingo retrasado.Para variar , meu time do coração era o azarão.Todos os cronistas esportivos (à excessão de Tostão) vaticinaram que o Flamengo era o favorito para conquistar a Taça Guanabara. Como todo botafoguense, mandei-os às favas.Vesti o sagrado manto alvi-negro e rumei para o Liverpool, ponto de encontro da aguerrida e apaixonada torcida alvinegra sediada em Belém.
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Que me perdoem os torcedores dos outros times, mas torcer pelos favoritos, pelos times que quase sempre vencem é fácil,muito fácil.Quero ver esperar 20 anos por um título.Amargar 50 anos à espera de um amor.
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Como diz Haroldo Fernandez: os deuses estavam contra.No segundo tempo recuamos, tivemos dois jogadores importantes excluídos, fomos tungados pela arbitragem...
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Nos acréscimos fomos batidos.Eu, os poetas Jorge Campos, Ronaldo Franco, todos nós,estávamos inconsoláveis.
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Na mesa ao lado, uma garota soluçava ao lado do pai.
Ao vê-la tristonha, lembrei da minha infância, a luta de judô quase ganha.Aproximei-me da pequena e puxei conversa:
-Quantos anos você tem ?
- Onze
- Perdemos uma batalha, mas não perdemos o campeonato.Ainda resta o segundo turno.Você é uma menina de sorte.Estuda, tem uma casa, papai e mamãe.Imagina se todo dia tivesse batatinha frita, pipoca, refri, aniversário, férias, Natal.Não tem graça, né ?
- É...
- Posso te contar um segredo ?
- Eu também tive vontade de chorar.
- Jura ?
- Juro pela fé da mucura!
- O que é uma mucura ?
- Um rato enorme que só come frutas.
- O senhor é engraçado.Fala que nem o meu avô. Quer um chiclete ?
...
* Na foto : Dênis Cavalcante e família botafoguense.
Dênis é cronista do Jornal Liberal.
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