Ana Rita era uma dessas meninas de olhos vivos e pouca fala. Baixinha, cabelos pretos e lisos cortados à Chanel, perto dos nove anos – dizia sempre que tinha sete, com vergonha da baixa estatura. Estava sempre em atividade, olhos perscrutadores, fazendo o que mais gostava: colecionar.
A menina colecionava tudo, o que deixava sua mãe em polvorosa. Haja armários, gavetas, caixas e pastas para guardar tanta coisa! Ela colecionava selos, sua primeira coleção – apesar da pouca idade escrevia muitas cartas para ter muitos e muitos selos. Ah, colecionava cartas também. Tinha uma grande coleção de caixas de fósforos, de revistas da Mônica e da Magali, de chaveiros. Colecionava botões que achava na rua e na escola – tinham que ser achados! Pedras e folhas secas. Amava sua coleção de bonecas de pano!
Enfim, Ana Rita colecionava mesmo.
Nomeava as coleções, selecionava, datava, arquivava. Um dia resolveu colecionar árvores.
- Mas como você vai colecionar árvores, minha filha?
Disse então à mãe que anotava tudo sobre a árvore: o nome da rua em que ficava, se estava na calçada ou no meio da praça, se tinha cercado, se estava bem ou precisando de cuidados. Nesses casos ligava para o órgão responsável e tascava uma bronca:
- Vocês não perceberam que uma de minhas mangueiras está cheia de erva-de-passarinho, precisando de limpeza e poda?, reclamava, indicando o endereço e deixando os funcionários perplexos.
- “Mas que menina!”.
Ah, ela sabia o nome de todas as árvores: acácia Mariana, mangueira Julia Roberts, castanholeira Alessandra, benjaminzeiro Arrelia (era um palhaço que ela viu certa vez na televisão e gostou muito).
Ana Rita adorava passear de carro com o pai e quando passava em determinado endereço e avistava uma árvore dizia:
- Pai, aquela ali é a Maria de Nazaré, uma mangueira da minha coleção.
Certa vez os pais estranharam a menina olhando pacientemente para o céu noites seguidas.
E descobriram, assustados, que Ana Rita passara a colecionar estrelas.
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2 comentários:
Ai meu Deus, se essa menininha quando crescer começar a colecionar namorados, as estrelas cairão todas por terra ahahahahaha
Muito lindo o texto do Marton!!!Bjs
Ana Rita na verdade era também uma colecionadora de sonhos...
E muitas vezes é necessário ter o coração feito de uma criança para não somar os volumes de nossas esperanças...
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