domingo, 2 de março de 2008
Os dez chopinhos
1º chopinho
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Beber sobre todas as coisas.Todas as coisas negativas.
Sobre as costas que carregam o peso da mentira. Sobre o exercício da sobrevivência.
Beber sobre as cabeças aprisionadas. Beber sobre as caras e bocas da hipocrisia.
2° chopinho
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Não tome o chopinho em vão. Apague os incêndios da tristeza. A espuma
faça lembrar beijos molhados de saliva.E cuidado: um gole de lembrança não resolve o amor passado.
(É ter um corpo no copo. Ou a mão no copo masturbando a ausência...)
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3° chopinho
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Mais um chopinho aguardando domingos e festas. Porque hoje é sábado
quase dedilhando a madrugada de domingo. Acenda um cigarro.Trague os silêncios de tardes íntimas.Como um vulcão, solte a fumaça do cotidiano.Pegue o guardanapo...Arranque poesias da esferográfica do garçom.É mais fácil do que falar sozinho.
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4° chopinho
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Honrar o descobridor de bares.
Pague a conta de um amigo desempregado como se fosse seu pai.
E alguém que lhe incomode, mande-o procurar a mãe.
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5º chopinho
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Não mate a sede: o quinto chopinho é um instante lírico.É uma possibilidade sedutora, potencialmente eficaz para se perder a timidez.Olhe como um boto a mulher chegando, inaugurando os mil olhos do desejo...
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6° chopinho
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Este chopindo é do pecado. Reivindica-se a boca da noite.Vocábulos em sílabas ou gemidos.E um incessante direito de amar o amor.
Não há mais sossego.
Desassossega o coração.
- E um brinde te ergue nua! -
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7º chopinho
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É falso o testemunho que diz : vai-se a um bar pelo dono do bar.
Vamos ao bar porque queremos o palco das ilusões.O palco que recupera a criatividade, a resistência ao tédio, solicita a intervenção da inteligência e do humor, ativa o erotismo e a prática democrática da conversa.
O bar decreta a morte do homem-pijama, do homem-tv, do voyeur.
Vamos ao bar para namorar a luxúria da noite.
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8° chopinho
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Provoca a mulher mais próxima...
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9° chopinho
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O poeta é o garçom das palavras :"Viver é desaprender o culto erudito !" A platéia aplaude.
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10° chopinho
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É a hora do adeus. Adeus ao bar. Para ser Deus atravessando o mar de duas luas e boiar nos olhos sóbrios da namorada como uma criança.
( RF)
(Do livro "Cidade das Águas" - RGB Editora/Editora Paka-Tatu)
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