domingo, 17 de fevereiro de 2008

Poeta Ruy Barata:"fazedor de uma poesia maior"


"Quero crer que minha geração tenha ficado com o Ruy, fazedor de uma poesia maior, mais alta,irmanada à dor universal que não se acomoda mais às margens, porque o rio se faz caudaloso e transbordará cobrindo as referências, as diferenças.
O anjo bêbado, notívago, perdido na escuridão dos labirintos, este é o anjo Ruy Barata que, a exemplo do anjo torto de Drummond, anuncia o perigo nas fronteiras do reconhecimento da espécie humana".
Maria Lúcia Medeiros (no livro Antilogia-RGB Editora)
Canção do Quarenta Anos
Poema, suspende a taça
pelos dias que vivi.
Espelho, diz-me em que jaça
mais fiel me refleti.
Quarenta anos correram
e neles também corri.
.
Quarenta anos, quarenta.
Quantos mais ainda virão ?
Morrerei hoje de infarto
ou amanhã de solidão?
Serei pasto da malária ?
Serei a presa do avião ?
.
A morte engendra esperança.
A morte sabe fingir.
A morte apaga a lembrança
da morte que vai ferir.
E em cada instante que passa
a morte pode surgir.
.
Quem pode medir um homem ?
Quem pode um homem julgar ?
Um homem é terra de sonhos,
sonho é mundo a decifrar.
Naveguei ontem no vento,
hoje cavalgo no mar.
.
Hoje sou. Ontem não era.
Amanhã, de quem serei ?
Um homem é sempre segredos.
Por qual deles purgarei?
Dos meus netos, qual o neto
em que me repetirei ?
.
Que virtudes foram minhas ?
Que pecados confessar ?
Que territórios de enganos
a meus filhos vou legar ?
A quem passarei meu canto
quando meu canto passar ?
.
Ah! Como a vida é ligeira!
Ah! Como o tempo deflui!
Este espelho não mais fala
da criança que já fui.
Das minhas rugas ruindo
apenas um nome rui.
.
Quedê rede balançando ?
Quedê peixinhos do mar ?
Quedê figo da figueira
pro passarinho bicar?
E o anel que tu me deste
em que dedo foi parar ?
.
Dezembro chama janeiro
Fevereiro vai chamar ?
Monte-Cristo se me visse
não iria acreditar.
Como está velho, diria
a donzela Dagmar.
.
Um homem cresce espalhando
o reino em que foi feliz.
Onde Athos ? Onde Porthos ?
Onde o tímido Aramis ?
Um homem cresce querendo
e cresce quando não quis.
.
Crescer é rima de vida,
mas também é de morrer.
Crescer é terna ferida
que só dói no entardecer.
Em cada raiz da morte
há sempre um verbo crescer.
.
E cresço: macho e poeta
Subo em linha, volto em cor.
Cresço violentamente.
Cresço em rajadas de amor.
Cresço nos filhos crescendo.
Cresço depois que me for.
.
Cresço em tempo e eternidade,
cresço em luta, cresço em dor,
não fiz meu verso castrado
nem me rendo ao opressor.
Cresço no povo crescendo,
cresço depois que me for.
.
E cresço na aurora livre
galopando esse corcel.
Cresço no verso espumando
entre as linhas do papel.
Cresço rubro de esperança
na barba de Don Fidel.
.
Quarenta anos, quarenta
E nem sequer percebi.
Quarenta anos correram
e neles também corri.
E nesses quarenta anos,
oitenta de amor por ti.
.

2 comentários:

Anônimo disse...

DEUS ME LIVRE!!EU AMO RUY BARATA..SENSIBILIDADE E FORÇA SE MISTURAM EM SEUS VERSOS...EU ADOROOOO..

Leka.

Anônimo disse...

ESTOU A PROCURA DE UM VERSO DE RUY BARATA...NAO LEMBRO AO CERTO O TITULO...MAS ACHO QUE "MEU AMOR Ê PRATO CHEIO"...GOSTARIA DE SABER EM QUE SITE ENCONTRA-LO...OU SE PODE POSTAR AQUI..
OBRIGADA..

Leka.