terça-feira, 26 de maio de 2009

Zé Rodrix e sua casa no campo >> Elias Ribeiro Pinto

Na sexta-feira passada o amigo Duval ligou, para me “pautar”, brincou. Queria saber se eu não iria escrever sobre o Zé Rodrix, que, por um bom tempo, formou um trio com Sá & Guarabyra, sendo que estes seguiram (e seguem) adiante como dupla. De vez em quando, ao sabor dos reencontros, voltavam a recompor-se como trio musical.

A música mais conhecida de Zé Rodrix, “Casa no Campo” (em parceria com Tavito), virou, na voz de Elias Regina, uma espécie de hino dos ripongas brasileiros, dos bichos-grilos e de todo bacana que, cansado do sistema e da paranoia das grandes cidades, queria largar tudo e ir para a mata. Aliás, outra música que também convocava todos a liberar seu lado Jeca Tatu era uma do Hyldon: devíamos jogar as mãos para o Céu e agradecer a graça de ter alguém com quem dividir o teto de uma fazenda ou de uma casinha de sapê, enquanto a chuva caía lá fora.

“Casa no Campo” é de 1972, por ali. Na década seguinte, reencontrei Zé Rodrix, que também era produtor, jornalista e publicitário, agora como leitor de uma coluna sobre livros que ele assinava na Folha de S.Paulo, para minha surpresa, já que não o imaginava como crítico literário. Na verdade, se não me falha a falha e desbussolada memória, Rodrix não chegava a resenhar os livros, mas trocava com o leitor impressões de leituras, contava causos, tudo assim, como quem ergue um brinde ao prazer da leitura. A coluna não chegou a vingar por mais de dois ou três anos.

Mais surpreso fiquei quando, dois, três meses atrás, topei, numa promoção de livros aqui em Belém, com um catatau, um tijolaço de mais de 600 páginas. Autor: Zé Rodrix. Sinceramente, não tinha notícia dessa sua investida como escritor de longo curso. E o assombro redobrou quando vi que o volume fazia parte de uma tal Trilogia do Templo. Conferi o preço, algo em torno de dez reais, bem em conta para o tamanho da obra, mas, depois de fuçar suas páginas, vi que o enredo, ficcional, flertava com templários, maçonarias & baratos afins. Olhe, eu já não estou tão esotérico assim. E aquele era o terceiro volume, ou seja, pegaria a história pelo fim. Desisti. Deixei para a próxima encarnação. E agora o Zé me vem com essa, de morrer.

Lendo, aqui e ali, algumas notícias de sua morte, seu necrológio, soube que, dos três (ele, o Sá e o Guarabyra), que se tornaram conhecidos por tocar rock rural, Rodrix era o mais urbano, visceralmente urbano.

Mas vivíamos assim mesmo, mais idealizando a tal casa no campo que efetivamente dando um jeito de comprá-la pelo BNH ou Funrural, sei lá, ou, ainda, erguê-la em mutirão, nem que fosse juntando forças numa comunidade sob as bênçãos do Grande Picareta, o Bhagwan Rajneesh, que também atendia pela alcunha de Osho.

Comunidade – eis a questão. Se a rapaziada daqueles anos 1970 não foi para o campo erguer sua casa – mas muitos, verdade seja dita, foram –, essa rapaziada malocou-se mesmo na cidade, passando a morar em comunidade.

Por ser da geração seguinte, eu não cheguei a adotar esse estilo de moradia compartilhada, mas visitei gente que seguia a filosofia comunitária que o Brasil conheceu, principalmente, através dos Novos Baianos, Pepeu, Moraes Moreira, Baby Consuelo, Paulinho Boca de Cantor, Luiz Galvão, aquela gente bronzeada que morava, no Rio de Janeiro, numa espécie de sítio.

Pois, como ia dizendo, cheguei a frequentar algumas dessas comunidades em Belém, formadas por músicos, jornalistas, antropólogos, professores, malucos-beleza, alguns em início de carreira. Daquele tempo, uns já morreram, outros deram um giro pelo mundo, voltaram, enquanto outros estão no auge da profissão.

A comunidade nem sempre se regia pela pretendida harmonia do paz e amor, e não raro pintavam acusações, bate-boca, coisa de família. O que havia de mais comunitário, sem dúvida, era o fumacê de maconha pairando sobre todos, como um halo comum. Sinal dos tempos, quando, em torno de um baseado, fumava-se o cachimbo da paz.

Meu caro Zé Rodrix: espero que agora você possa, em paz, no silêncio dos campos eternos (strawberry fields forever), viver entre amigos, discos e livros, e nada mais.

Um comentário:

papistar_nunes disse...

E eu graças a Deus, "riponguei"por essas comunidades, inclusive na de Pepeu, Baby, Galvão e Moraes Moreira mas não no Rio, na Pituba em Salvador.Lá ninguém dormia, ensaio a noite toda e muito futebol nas madrugadas, nas arenas na beira da praia e "os pingos da chuva a me molhar"não me impediam de me "esfumaçar", nas idolatrias da época. Sobreviví, sou feliz com a memória e o coração, cheios de histórias e emoções para contar. Beijos poeta!!!