MAIAKOVSKI - O Poeta da Revolução
Aleksandr Mikhailov
Editora Record, tradução de Zoia Prestes, 560 páginas, R$68
MAIAKOVSKI!
Elias Ribeiro Pinto
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Os versos do poeta Vladimir Vladimirovitch Maiakovski (1893-1930) alopraram os meus 18, 19, 20 anos de idade. Descobri-o naquela edição de 1967 (pela Tempo Brasileiro?), em tradução dos irmãos Campos mais Boris Schnaiderman. Um amigo, a quem emprestei o volume, me fez o favor de encaderná-lo em sólida armadura (quando emprestar, afinal, vale o risco), apta a enfrentar as quebradas nas quais, de improviso, eu armava meu palanque poético e encarnava a persona do “férvido cantor”. Assim blindado, o livro freqüentou incontáveis, concorridas e encardidas mesas de botequins, cumprindo o lemalambique do poeta russo: “Há um velho sistema:/ Vamos encher a cara!/ Afogar/ as penas/ no vinho”.
Os versos do poeta Vladimir Vladimirovitch Maiakovski (1893-1930) alopraram os meus 18, 19, 20 anos de idade. Descobri-o naquela edição de 1967 (pela Tempo Brasileiro?), em tradução dos irmãos Campos mais Boris Schnaiderman. Um amigo, a quem emprestei o volume, me fez o favor de encaderná-lo em sólida armadura (quando emprestar, afinal, vale o risco), apta a enfrentar as quebradas nas quais, de improviso, eu armava meu palanque poético e encarnava a persona do “férvido cantor”. Assim blindado, o livro freqüentou incontáveis, concorridas e encardidas mesas de botequins, cumprindo o lemalambique do poeta russo: “Há um velho sistema:/ Vamos encher a cara!/ Afogar/ as penas/ no vinho”.
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Depois saiu uma outra edição, revista e ampliada, acho que pela Perspectiva. Esta, sem blindagem para poupá-la, viu-se vítima de meus arroubos declamatórios. Explico. Em ancestral noite etílica, a cavaleiro do sobrado onde morava, na Pedreira, o pátio aberto às estrelas, eu declamava Maiakovski aos camaradas circunstantes – e só quem já recitou o bardo, “a plenos pulmões”, sabe da força febril de seus versos, não fora o poeta um eloqüente tribuno dos próprios poemas.
Depois saiu uma outra edição, revista e ampliada, acho que pela Perspectiva. Esta, sem blindagem para poupá-la, viu-se vítima de meus arroubos declamatórios. Explico. Em ancestral noite etílica, a cavaleiro do sobrado onde morava, na Pedreira, o pátio aberto às estrelas, eu declamava Maiakovski aos camaradas circunstantes – e só quem já recitou o bardo, “a plenos pulmões”, sabe da força febril de seus versos, não fora o poeta um eloqüente tribuno dos próprios poemas.
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Pois bem. Ao fim da rajada versejante, e aproveitando o silêncio que se seguiu, gratinado pelas palavras em brasa que eu dardejara, ainda suspenso no parapeito, dali lancei, com ímpeto revolucionário, o livro ao chão, o choque libertando, como no espocar do champanhe, além da capa do volume, jorros de metáforas, paronomásias e ritmos coriscantes, iluminando a noite e ofuscando os que vertem “versos feito regador”, e aqueles que os babam, bonifrates encapelados. Maiakovski, suponho, não reprovaria meu gesto olímpico de atirar seu livro à noite. Pediria mais vodca e balalaica.
Pois bem. Ao fim da rajada versejante, e aproveitando o silêncio que se seguiu, gratinado pelas palavras em brasa que eu dardejara, ainda suspenso no parapeito, dali lancei, com ímpeto revolucionário, o livro ao chão, o choque libertando, como no espocar do champanhe, além da capa do volume, jorros de metáforas, paronomásias e ritmos coriscantes, iluminando a noite e ofuscando os que vertem “versos feito regador”, e aqueles que os babam, bonifrates encapelados. Maiakovski, suponho, não reprovaria meu gesto olímpico de atirar seu livro à noite. Pediria mais vodca e balalaica.
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Outra aventura maiakovskiana foi no campus da UFPA. Fazia Ciência Política III com o mestre Amílcar Tupiassu. Um dia, entediado do sociologuês – não do professor, que era cativante e boa praça –, entro na sala com uma garrafa de uísque, Dimple, e sob o sovaco o inevitável Vladimir Vladimirovitch. Peço licença, ofereço uma dose ao mestre, com carinho. Fleumático, adepto do fair play, Tupiassu recusa. Comunico então, em caráter extraordinário, que Marx cederá lugar à poesia. Convido Tupiassu a ocupar lugar de honra entre os alunos e escalo a mesa professoral, agora púlpito poemático: “Professor,/ jogue fora/ as lentes-bicicleta!/ A mim cabe falar/ de mim/ de minha era”.
Outra aventura maiakovskiana foi no campus da UFPA. Fazia Ciência Política III com o mestre Amílcar Tupiassu. Um dia, entediado do sociologuês – não do professor, que era cativante e boa praça –, entro na sala com uma garrafa de uísque, Dimple, e sob o sovaco o inevitável Vladimir Vladimirovitch. Peço licença, ofereço uma dose ao mestre, com carinho. Fleumático, adepto do fair play, Tupiassu recusa. Comunico então, em caráter extraordinário, que Marx cederá lugar à poesia. Convido Tupiassu a ocupar lugar de honra entre os alunos e escalo a mesa professoral, agora púlpito poemático: “Professor,/ jogue fora/ as lentes-bicicleta!/ A mim cabe falar/ de mim/ de minha era”.
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Finda a récita poética, à porta da sala de aula acotovelava-se súbita platéia, que antes, em estado de pastoreio, ruminava nos corredores.
Finda a récita poética, à porta da sala de aula acotovelava-se súbita platéia, que antes, em estado de pastoreio, ruminava nos corredores.
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Pensei até em fundar uma “Companhia de Desmanche de Aulas”. O interessado dirigir-se-ia ao competente encarregado, combinando hora e local da aula a ser interrompida. Em seguida, ao suplicante seria apresentado o nosso catálogo de poemas, a fim de atender possíveis preferências, com as opções indo de Castro Alves a Bertolt Brecht, passando por Drummond, Fernando Pessoa, Walt Whitman e Allan Ginsberg, sem esquecer, é claro, Maiakovski.
Pensei até em fundar uma “Companhia de Desmanche de Aulas”. O interessado dirigir-se-ia ao competente encarregado, combinando hora e local da aula a ser interrompida. Em seguida, ao suplicante seria apresentado o nosso catálogo de poemas, a fim de atender possíveis preferências, com as opções indo de Castro Alves a Bertolt Brecht, passando por Drummond, Fernando Pessoa, Walt Whitman e Allan Ginsberg, sem esquecer, é claro, Maiakovski.
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À vera, universitário, cheguei a formar uma companhia mambembe de oradores e/ou declamadores, que saía em grupo, devidamente supridos de poemas que eu distribuía momentos antes.
À vera, universitário, cheguei a formar uma companhia mambembe de oradores e/ou declamadores, que saía em grupo, devidamente supridos de poemas que eu distribuía momentos antes.
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Numa ocasião, pelo menos dois pavilhões do campus foram tomados de assalto pelos brancaleones do verso. Tiveram que convocar a segurança universitária para pôr fim ao movimento insurrecto da rima unida jamais será vencida.
Numa ocasião, pelo menos dois pavilhões do campus foram tomados de assalto pelos brancaleones do verso. Tiveram que convocar a segurança universitária para pôr fim ao movimento insurrecto da rima unida jamais será vencida.
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Mas sim, voltando a Maiakovski, glorificado e xingado, colocado e retirado do pedestal, líder da vanguarda poética do cubo-futurismo russo, ele foi, acima de (ou abaixo de) tudo, o poeta que flertou incansavelmente com o suicídio em seus versos-vértebras, até consumar-se, in totum, suicida.
Mas sim, voltando a Maiakovski, glorificado e xingado, colocado e retirado do pedestal, líder da vanguarda poética do cubo-futurismo russo, ele foi, acima de (ou abaixo de) tudo, o poeta que flertou incansavelmente com o suicídio em seus versos-vértebras, até consumar-se, in totum, suicida.
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Lembro do poema “A Serguei Iessiênin”, em que Maiakovski condena a babugem sentimentalóide e desnuda a posição hipócrita da crítica quando do suicídio de Iessiênin em 1925, cinco anos antes de o próprio Maiakovski cometer o gesto que condenara, em verso, no amigo.
Lembro do poema “A Serguei Iessiênin”, em que Maiakovski condena a babugem sentimentalóide e desnuda a posição hipócrita da crítica quando do suicídio de Iessiênin em 1925, cinco anos antes de o próprio Maiakovski cometer o gesto que condenara, em verso, no amigo.
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Lembro também – e só posso lembrar, pois, como vocês sabem, não encontro, nesse bárbaro matagal de livros, nenhum de que, urgente, preciso, e já nem me dou ao desperdício de procurá-lo – de outro poema, “Lílitchka!”, uma das mais belas peças líricas do espólio poético mundial, em que revém a letomania do autor: “E não me lançarei no abismo,/ e não beberei veneno,/ e não poderei apertar na têmpora o gatilho”.
Lembro também – e só posso lembrar, pois, como vocês sabem, não encontro, nesse bárbaro matagal de livros, nenhum de que, urgente, preciso, e já nem me dou ao desperdício de procurá-lo – de outro poema, “Lílitchka!”, uma das mais belas peças líricas do espólio poético mundial, em que revém a letomania do autor: “E não me lançarei no abismo,/ e não beberei veneno,/ e não poderei apertar na têmpora o gatilho”.
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Evidente que esta série de negações pressupõe o desejo suicida, como a pedir, implorar à amada: “Não o consintas,/ meu amor,/ meu bem”. Coincidência. Enquanto vou citando “Lílitchka!”, da janela do vizinho desce o som de Tim Maia: “Não quero dinheiro, quero amor sincero, isso é o que eu mais quero...”.
Evidente que esta série de negações pressupõe o desejo suicida, como a pedir, implorar à amada: “Não o consintas,/ meu amor,/ meu bem”. Coincidência. Enquanto vou citando “Lílitchka!”, da janela do vizinho desce o som de Tim Maia: “Não quero dinheiro, quero amor sincero, isso é o que eu mais quero...”.
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E vamos aproveitar enquanto o poema de Maiakovski vem-me, fresco, à memória: “Se ela assim torturasse um poeta,/ ele trocaria sua amada por dinheiro e glória,/ mas a mim/ nenhum som me importa/ afora o som do teu nome que eu adoro”. E não resisto, melhor que não resista ao caboco maiakovskiano que agora baixa em mim: “De qualquer forma/ o meu amor/ – duro fardo por certo –/ pesará sobre ti/ onde quer que te encontres”.
E vamos aproveitar enquanto o poema de Maiakovski vem-me, fresco, à memória: “Se ela assim torturasse um poeta,/ ele trocaria sua amada por dinheiro e glória,/ mas a mim/ nenhum som me importa/ afora o som do teu nome que eu adoro”. E não resisto, melhor que não resista ao caboco maiakovskiano que agora baixa em mim: “De qualquer forma/ o meu amor/ – duro fardo por certo –/ pesará sobre ti/ onde quer que te encontres”.
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Quanto ao “e não poderei apertar na têmpora o gatilho”, Maiakovski apenas mudou de alvo. Em vez da cabeça, disparou um balaço no peito. Acossado pela recorrente idéia do suicídio, Maiakovski, nos seus versos, sempre mirou o futuro, dialogou com o porvir. “Ressuscita-me, quero acabar de viver o que me cabe!”. Com o suicídio, o poeta acertou as contas com a vida, mas deixou o futuro de sua obra em aberto.
Quanto ao “e não poderei apertar na têmpora o gatilho”, Maiakovski apenas mudou de alvo. Em vez da cabeça, disparou um balaço no peito. Acossado pela recorrente idéia do suicídio, Maiakovski, nos seus versos, sempre mirou o futuro, dialogou com o porvir. “Ressuscita-me, quero acabar de viver o que me cabe!”. Com o suicídio, o poeta acertou as contas com a vida, mas deixou o futuro de sua obra em aberto.
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Bem, confesso, admito, já não tenho paciência didática para fazer um apanhado biográfico de Maiakovski, acompanhado de palavras que possam situá-lo no tempo em que viveu, levando o leitor para mais perto de sua obra. Ora, mas por isso mesmo estou escrevendo este texto. Quem se interessar, há uma boa biografia do poeta recentemente chegada ao Brasil.
Bem, confesso, admito, já não tenho paciência didática para fazer um apanhado biográfico de Maiakovski, acompanhado de palavras que possam situá-lo no tempo em que viveu, levando o leitor para mais perto de sua obra. Ora, mas por isso mesmo estou escrevendo este texto. Quem se interessar, há uma boa biografia do poeta recentemente chegada ao Brasil.
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Trata-se de Maiakovski – O Poeta da Revolução. Seu autor, o também poeta Aleksandr Mikhailov, revela as contradições e paradoxos desse ícone de toda uma geração. Um dos maiores poetas da Rússia, Maiakovski pôs fim à própria vida aos 37 anos de idade. O biógrafo narra a vida desta personalidade polêmica e aponta os motivos por trás de suas ações. Mobilizado e aclamado pela revolução soviética, Maiakovski carregava em si as marcas da experiência social iniciada em 1917.
Trata-se de Maiakovski – O Poeta da Revolução. Seu autor, o também poeta Aleksandr Mikhailov, revela as contradições e paradoxos desse ícone de toda uma geração. Um dos maiores poetas da Rússia, Maiakovski pôs fim à própria vida aos 37 anos de idade. O biógrafo narra a vida desta personalidade polêmica e aponta os motivos por trás de suas ações. Mobilizado e aclamado pela revolução soviética, Maiakovski carregava em si as marcas da experiência social iniciada em 1917.
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Maiakovski deixou uma biografia tão impressionante quanto sua obra. Uma vida marcada por algo de passional, de heróico, de trágico.
Maiakovski deixou uma biografia tão impressionante quanto sua obra. Uma vida marcada por algo de passional, de heróico, de trágico.
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Espírito romântico, ele é um personagem de si próprio. Esse homem de quase dois metros de altura, em algumas fotos de grande beleza física, em outras de uma rudeza campesina, é revelado aqui em seus paradoxos e contradições.
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As lutas estéticas e ideológicas. A riqueza metafórica e rítmica de sua poesia. Sua maestria no uso das hipérboles, seu humor cáustico, seu virtuosismo no jogo das palavras.
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Mikhailov explora essas nuances, as contradições que dilaceravam sua alma, as discussões e discordâncias ressonantes ainda hoje.
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2 comentários:
Noossaaa desde de que conheci a escrita dele p/a mim a poesia mudou... acrescentou ...ótima escolha e melhor ainda foi o livro dele que eu achei ironicamente chamado -Poética "Como fazer versos"
parte teorica e opininões do autor se tiver curiosidade eu recomendo!!!!
Neste sábado à noite, num momento de tédio, lancei no Google "suicídio de Iessiênin" e cheguei aqui. Excelente postagem, sobre Maiakovsky. Há pouco -eu que sempre fui fã de Volódia- li a mesma biografia. Sem palavras, parabéns.
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